A Cooperação Internacional para o Desenvolvimento (CID) pós 2015: agendas para as Organizações da Sociedade Civil brasileiras é publicado em conjunto por PAD – Processo de Articulação e Diálogo e ABONG – Associação Brasileira Organizações Não Governamentais
Autores: Maria Elisa Huber Pessina – Coordenadora e Elsa Sousa Kraychete Colaboração: André Coelho e Stella Ananda
Em 2015, a agenda do desenvolvimento foi renovada com o estabelecimento dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS). O documento Transformando o Nosso Mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável anunciou 17 objetivos a serem cumpridos até 2030 com forte apelo para uma solidariedade global que integre todos os atores. Este estudo de base desdobra o significado da agenda da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento pós 2015 e fornece um quadro sobre as abordagens dos doadores na cooperação com o Brasil, identificando as possibilidades de participação e ações para as Organizações da Sociedade Civil (OSC) brasileiras.
Principal instrumento da Cooperação Internacional, a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento (AOD) tornou-se um mecanismo em grande escala de transferência de recursos públicos com volume, em 2019, de U$ 152,8 bilhões, provenientes dos países doadores que compõem o Comitê de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE (CAD/OCDE).
Em 2015, no âmbito da Agenda 2030, foram adotados, também, o Acordo de Paris sobre a redução dos gases de efeito estufa e a Agenda de Ação de Adis Abeba (AAAA). O Acordo de Paris coloca a agenda da mitigação e adaptação às mudanças climáticas no centro da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento. A Agenda de Ação de Adis Abeba 2015 reconhece que mais recursos internos e externos precisam ser mobilizados para o alcance dos ODS, cuja estimativa total é de 2,5 trilhões de dólares por ano. A constatação da limitação dos orçamentos públicos para AOD levou os atores do desenvolvimento a estabelecerem parcerias com o setor privado para alavancar e/ou subsidiar investimentos privados de impacto. Desde então, a OCDE vem coordenando o desenvolvimento do Total Official Support for Sustainable Development (TOSSD), um novo quadro estatístico internacional para monitorar, contabilizar e publicitar não apenas os recursos oficiais, como também, o financiamento privado mobilizado por intervenções oficiais em apoio ao desenvolvimento sustentável.
Na nova agenda da cooperação tem ganhado centralidade temas como: mudanças climáticas; promoção a transição energética; apoio à conduta empresarial responsável e às cadeias de valor sustentáveis; promoção do comércio justo e sustentabilidade social e ecológica nas cadeias de fornecimento globais; empréstimos e contribuições para alavancagem de fundos do mercado para proteção dos bens globais; proteção, conservação e uso sustentável das florestas; Infraestrutura Sustentável; biodiversidade; Regulamentação do mercado financeiro sustentável e títulos verdes (Green Bonds).
Em 2019, do total da OAD contabilizada pelo CAD/OCDE, apenas 13,8% foi direcionado para parcerias com ONGs, maioria baseada nos países doadores. Entre 2017 e 2018, as OSC baseadas nos países em desenvolvimento receberam apenas 5,3% deste montante.
Entre os países doadores, o percentual da AOD bilateral canalizada via OSC varia: Suíça – 34,7%; Noruega – 26,5%; Reino Unido – 16%; Alemanha – 7% e França – 3,7%.
Varia, também, o perfil das OSC com as quais os doadores cooperam: Alemanha coopera, quase exclusivamente, por meio das organizações baseadas em seu território; França coopera, principalmente, com organizações baseadas em seu território, seguidas das internacionais; Noruega coopera, significativamente, com OSC localizadas no país receptor (em 2019, 94% do orçamento de sua cooperação bilateral com o Brasil foi via OSCs – 46 brasileiras, 13 internacionais e 17 norueguesas); Reino Unido canaliza a AOD via OSC baseadas no país doador e via internacionais; Suíça prioriza OSC baseadas em seu território, seguida de significativas contribuições com as internacionais e, em menor número, OSC baseadas em países parceiros.
O Discurso comum dos doadores e da OCDE em torno do papel a ser desempenhado pelas OSC converge para a necessidade do fortalecimento dessa relação, seja na execução de projetos e programas, seja acompanhando e fiscalizando o engajamento do setor privado.
Dentre as agendas da cooperação oficial com o Brasil dos 5 países analisados, em 2019, destacamos alguns temas recorrentes: clima; proteção e conservação das florestas; regulamentação do mercado financeiro sustentável; cadeias produtivas sustentáveis; agricultura de baixo carbono; aumento do investimento do setor privado no desenvolvimento sustentável.
Diversas OSC brasileiras acumulam larga experiência de parcerias com organizações internacionais. No momento em que os países doadores ressaltam a importância da inclusão de OSC no atendimento da agenda do Desenvolvimento Sustentável, recomenda-se que as OSC brasileiras tornem pública a expertise acumulada nessas parcerias. As OSC brasileiras detém experiência que estão em sintonia com a atual agenda internacional e as credenciam como parceira, por: desenvolver ações entre pessoas em situação de vulnerabilidade; supervisionar ações a favor do desenvolvimento sustentável e inclusivo; fornecer serviços complementares aos prestados pelos governos de forma participativa; deter flexibilidade metodológica para trabalhar em temas como educação, saúde e meio ambiente.
No contexto da Agenda pós 2015, sugere-se duas principais linhas para atuações das OSC brasileiras em advocacy: incidência crítica sobre a destinação de recursos da AOD para alavancar investimentos do setor privado para alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS); maior participação da Sociedade Civil tanto na execução dos programas de AOD como no monitoramento das ações do Estado e de empresas privadas.
As OSC brasileiras devem buscar se inserir nas duas principais redes de OSC que atuam no âmbito do CAD/OCDE, apropriando-se sobre os debates sobre eficácia da ajuda internacional ao tempo que verificam mudanças possíveis de serem adotadas em seus mecanismos de gestão e accountability. Sem abandonar os canais já estabelecidos, é de relevante importância reforçar a cooperação com países que contemplam parcerias diretamente com OSC do país em desenvolvimento, como a Noruega, e criar laços com OSC de países doadores que destinam montante significativo de sua AOD para as Organizações da Sociedade Civil baseadas em seu território, como é o caso da Suíça e Reino Unido.
Por fim, o fortalecimento da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento via Organizações da Sociedade Civil merece maior consideração no momento em que a participação da sociedade civil em espaços governamentais é minimizada e criminalizada em diversos países em desenvolvimento, dentre eles, no Brasil.
Fonte: pad.org.br